A Lei nº11.635, de 27 de dezembro de 2007, institui o dia 21 de janeiro como o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. A data rememora o dia do falecimento da mãe de santo Mãe Gilda, do terreiro Axé Abassá de Ogum (BA), vítima de intolerância por ser praticante de religião de matriz africana. A mãe de santo foi acusada de charlatanismo, teve sua casa atacada e pessoas da comunidade foram agredidas. Ela faleceu no dia 21 de janeiro de 2000, vítima de infarto, decorrente dessa agressão sofrida.
Em razão dessa data, o grupo Calundu foi convidado pela TV Justiça para explicar um pouco sobre esse tema tão crucial à democracia brasileira. É importante apontar que, infelizmente, há pronunciado aumento das denúncias de intolerância religiosa no Disque 100 nos últimos anos. De apenas 15 denúncias em 2011 – primeiro ano do submódulo específico –, chegamos a 759 em 2016. Esse aumento da hostilidade à liberdade religiosa, particularmente danoso às minorias, está também associado a um manifesto crescimento dos atentados à laicidade estatal. Entre 2011 e 2017, o Disque 100 registrou 2356 denúncias de discriminação religiosa, sendo que 508 casos se referem a pessoas que se declaram pertencentes às religiões de matriz africana, ou seja, em média 20% do total de denúncias registradas no período. E, ainda, mais recentemente, de acordo com a pesquisa do Datafolha divulgada em janeiro de 2020, dados do Disque 100, divulgados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, indicam que 59% das denúncias de discriminação religiosa recebidas foram de umbandistas, candomblecistas e outras religiões afro-brasileiras. Há, portanto, um dado público e bem concreto que mostra que a violência advinda da intolerância religiosa é maior quando se trata das religiões afro-brasileiras. E cabe dizer que, ainda, esses são dados subnotificados. Há muito que acontece que não se diz, que não se informa, não se denuncia.
Observando esses dados, é também importante que se diferencie intolerância religiosa e racismo religioso, que é o que de fato ocorre com as maiores vítimas de perseguição religiosa no Brasil: as religiões afro-brasileiras. Isso se deve ao fato do racismo estrutural existente na sociedade brasileira que alcança, obviamente, o aspecto religioso, pois quando se analisa a intolerância sofrida por grupos religiosos devido à cor da pele da vítima ou a sua dimensão histórica e cultural, verifica-se que é o elemento racial que define as discriminações e violências. Há, portanto, uma estratégia racista em demonizar as religiões de matrizes africanas, fazendo com que elas apareçam como o grande inimigo a ser combatido, não apenas com o proselitismo nas palavras, mas também com ataques aos templos e, mesmo, à integridade física e à vida dos praticantes destas religiões. Assim, isso que visualizamos sob a forma da intolerância religiosa nada mais é que uma faceta do pensamento e prática que podemos chamar de racismo religioso. A argumentação é de que esse preconceito estaria ligado à formação colonial, à divisão e valoração racial negativa, influenciando na compreensão desta religião.
Nesse sentido foi a entrevista concedida pelo pesquisador e sociólogo Guilherme Nogueira à TV Justiça. Para saber mais, acesse o vídeo abaixo: