Nossa reunião do dia 12 de junho de 2024 foi conduzida por Hans Carrillo Guach, que trouxe para discussão a obra “Embarazo en la cabeza, no en el útero”, traduzida para o português como “Gravidez na cabeça, não no útero”. O texto foi escrito pelo próprio Hans juntamente com sua companheira Angélica María Rivera López.
A partir de trabalho etnográfico, o/a autor/a discorrem sobre a experiência de Angélica e Hans, motivada/o pela busca de soluções para problemas de fertilidade que enfrentaram. O casal tentou ter filhos durante doze anos, enfrentando múltiplos abortos espontâneos e uma gravidez de alto risco, com a perda sua filha Iara, que nasceu prematura. As vivências que tiveram em torno a tudo isso a/o levou a buscar ajuda espiritual.
No contexto das doenças reprodutivas femininas, se explora no texto a relação entre religiões e aspectos como gravidez, parto, mortalidade materna e cuidados ginecobstétricos. Religiões afro-latino-americanas são destacadas, mostrando como mobilizam energias vitais e estados de consciência que possibilitam transformações associadas à cura. O objetivo do artigo é compreender a possiblidade de apoio à cura das doenças reprodutivas femininas que pode oferecer a aforreligiosidade, a partir de consultas ao oráculo Diloggún, da Regla Ocha (Santería) afro-cubana, baseada na ideia de cura simbólica – teoria de Dow, que bebe em trabalhos de autores como Levi Strauss. A cura simbólica é descrita em fases que envolvem mundos espirituais compartilhados, pontes simbólicas e persuasão, transações simbólicas/biológicas e transformação experiencial.
Um dos pontos de destaque da nossa reunião foi a crítica à antropologia estruturalista em relação às pesquisas sobre a cura, que em sua maioria expõe os estudos de maneira cética por um ponto de vista ocidental, que não valoriza as complexidades culturais, afetivas e simbólicas dos ritos de cura nas religiões afro.
Durante nossa discussão, foram pontuadas as semelhanças e diferenças entre o candomblé praticado no Brasil e a Santería praticada em Cuba. Em ambas as religiões, a experiência da busca pela cura permite uma compreensão que vai além do visível, muitas vezes fornecendo o que a pessoa precisa, e não necessariamente o que ela quer. O Diloggún oferece conexões com o passado, presente e futuro, e em todas as relações que o permeiam, o que vai muito além da mera cura de sintomas. Falando por meio dos búzios jogados nesse oráculo, a afrorreligiosidade leva em conta pontos sociais e de relacionamento, fazendo com que se propor a se curar seja também se propor a se transformar.
Texto escrito por Iara Silva Bidô, sob a supervisão de Guilherme Dantas Nogueira
